Uma equipa de cientistas portugueses, radicada em
Londres, para onde emigrou, por sugestão do nosso primeiro-ministro, trabalha
arduamente (sem horário) num projeto sugerido pela ministra das finanças,
intitulado “comida mágica em restaurantes de luxo”.
Pretende a ministra que os pobres e os famintos portugueses
(esses ingratos, que passam a vida a queixar-se) tenham acesso a restaurantes
de luxo e aí possam “deglutir virtualmente” saborosos e suculentos pratos de
“comida mágica” em ambiente requintado.
Em cada bairro, em cada aldeia e vila e em pontos
estratégicos das cidades, através de “sofisticada multimédia” (que também
vestirá os pobres e os famintos com “fatos e sapatos de marca”) serão
inaugurados restaurantes virtuais de luxo, de tamanho adequado às necessidades.
As ementas serão criteriosamente escolhidas para garantir a saúde dos
consumidores. O objetivo final é conseguir montar esta tecnologia em todas as
casas dos não-ricos, de forma a obter uma poupança que permita ao Governo, à
Assembleia e à Presidência da República, duplicar os seus escassos meios, de
forma a garantir o bem- estar dos “altos
dignitários" e “dignificar" Portugal nas representações diplomáticas e de
Estado.
Virtualmente, criam-se espaços acolhedores, decorados e
mobilados com os últimos “gritos da moda”, onde são postas grandes mesas
recheadas com as mais sofisticadas iguarias, sólidas e líquidas. As toalhas e
os guardanapos são de seda pura, os pratos de porcelana finíssima, os copos de
cristal, os talheres são de ouro, com cabo de marfim incrustado com diamantes. Todos
os empregados vestem a rigor.
Dos vinhos, o mais barato é o “barca velha”.
Gratuitamente os “famintos” (mediante prévia inscrição pela
internet) são transportados de limusina até ao local. Os que moram mais
distante são transportados em hélios da Força Aérea ou em fragatas da Marinha.
Ao Exército cabe zelar pela segurança, de forma a evitar desacatos. Uma vez no
local os famintos têm direito à presença de destacados membros do governo e a
assistir a palestras proferidas por “sábios formadores” de renome
internacional, pagos a peso de ouro.
Segundo consegui apurar, os restaurantes virtuais vão
permitir que, por um euro (metido numa sofisticada máquina de origem alemã) os
famintos tenham acesso a visionar, durante meia hora, as mais apetitosas refeições
que se possam imaginar, criteriosamente expostas nas mesas virtuais. Findo esse
período os famintos abandonam o local e já no exterior, um corpo de “sorridentes
voluntárias” ( o Voluntariado está na berra!) depois de lhes perguntarem se a
comida era boa, entregam-lhes um pãozinho e uma garrafa de água para o jantar,
chamando-lhes à atenção para os perigos da comida em excesso.
(Pelo ritmo a que decorre a “investigação” presume-se que
brevemente haverá restaurantes destes em todas as casas de famintos, pobres e
remediados portugueses...)! Esta medida para além de promover a investigação
científica e a educação para a saúde, ajuda a desenvolver novas tecnologias, a movimentar
as Forças Armadas (que assim reforçam a utilidade da sua existência) a justificar
a existência de alguns ministérios que promovem a pobreza como solução e, até,
para justificar a existência da Xoné dos bifes!
Alguns “mal formados” esquecem-se que têm direito a
visionar o melhor da cozinha portuguesa durante meia hora e dizem que um euro,
por um pão e uma água, é caro! Esses “malvados” não se lembram dos quase
duzentos euros mensais que recebem de “esmola” , que saem dos bolsos dos
ricaços, coitados!
Mesmo que gastem sessenta euros mensais em refeições,
ainda sobram cento e quarenta, dizem os “entendidos”. Quem os manda ter casa
para terem que pagar água e luz? Quem os manda adoecer? Quem os manda ter
aspirações? Quem os manda vestir e calçar-se? Quem os manda gostar de passear? Quem
os manda não andar sempre a pé, que faz tão bem à saúde? Quem os manda gostar
de aprender ou de ir ao cinema e ao teatro? Quem os manda gostar de comprar
livros? Quem os manda gostar de serem lives?
Post Scriptum
Com a falta de jeito e credibilidade da Oposição, o
governo garante que os restaurantes virtuais vão ser mais um sucesso na Reforma
do Estado, tal como foi a internacionalização do ovo estrelado e do pastel de
nata. Passos Coelho e todo o seu elenco continuam empenhadíssimos no “desenvolvimento”
do País, estando prevista para breve a reforma do pastel de bacalhau, do
direito ao ar e ao sol e a internacionalização do piu piu que põe ovos cozidos
e abre garrafas de cerveja e refrigerante com os pequenos lábios!
Que ninguém diga que os famintos não são uma bênção! Se
não fossem eles o que seria de tanta gente que trabalha para que não deixem de
existir?
Numa sociedade desenvolvida como a nossa as casas da sopa
estão completamente desatualizadas. Os restaurantes virtuais para além da
higiene que os carateriza, dos desperdícios e do lixo que evitam e da
modernidade que consolidam são um precioso espaço de convívio. São ainda um
baluarte educativo, pois não permitem que as pessoas falem com a boca cheia!
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